Quer dançar um Tango?

©Musée National d’Art Moderne de Paris
Sonia Delaunay
Baile Bullier

Estava eu a passear pela exposição da artista Sonia Delaunay, quando me deparo com uma tela de quase 4 metros de comprimento.  Foi impossível não parar e observar as cores que pareciam dançar, eu até comecei a escutar um Tango! À primeira vista essa tela parece ser uma abstração completa de cores e formas, mas quando prestamos atenção percebemos algumas formas que nos lembram casais que dançam... Bom, quando olhamos o título da obra “Baile Bullier”, confirmamos nossas suspeitas! Eu bem que disse que escutei um Tango.


Sonia Delaunay nasceu na Ucrânia em 1885, passou a infância e a juventude em São Petersburgo e mudou-se para Paris em 1905. Ela aprofundou seus estudos em Pintura, porém considerou seus cursos tradicionais e engessados demais e começou a freqüentar os artistas contemporâneos. Nessa época ela conheceu seu marido e parceiro artístico, o pintor Robert Delaunay. Robert nessa época explorava os novos caminhos da arte, e estudava a Teoria da Cores, e então, juntos eles formaram uma nova corrente artística chamada “Simultaneísmo”.

Essa corrente artística buscava representar a realidade de uma maneira que se distanciava da Pintura Clássica. Como já citei no texto sobre Henri Matisse, a frase do artista e teórico da arte Maurice Denis, explica muito bem o conceito de Pintura na Arte Moderna: “(...) lembrar-se de que um quadro- antes de ser um cavalo de batalha, uma mulher nua ou um fato pitoresco qualquer - é essencialmente uma superfície plana recoberta de cores dispostas numa certa ordem”. Os Delaunay buscavam representar o mundo não como o vemos, criando a ilusão de realidade, mas eles buscavam representar a dissolução das formas sob os efeitos da vibração cromática da luz.

Ficou complicado? Então para simplificar, vamos ver como a Sonia Delaunay colocou em prática essa teoria.


Em 1913, Sonia realiza esse quadro inspirada pela dança do Baile Bullier, onde ela explora a luz e o movimento que um salão de baile oferece.  O formato longo da obra (3,90m) permite que Sonia desenvolva ao longo da tela a sugestão do movimento dinâmico da dança. As silhuetas dos casais se fundem em cores como em um caleidoscópio. Os dançarinos parecem girar pela pista de dança, e ao mesmo tempo, temos a impressão visual daquilo que os dançarinos vêem enquanto dançam, as formas nos sugerem a sensação de dançar e rodopiar ao som de um Tango por um salão.




A artista consegue essa impressão visual através do uso de pequenas superfícies de cores puras, que Sonia dispõe baseada na Teoria da Cores. Essa Teoria foi desenvolvida na metade final do século XIX e buscava determinar como o olho humano enxerga as cores. Os pesquisadores determinaram que cores ditas “complementares”, realçam certas cores quando são colocadas próximas a estas. Sonia utilizava as cores, buscando os efeitos óticos desse contraste de cores complementares. Desse contraste simultâneo de cores para sugerir o movimento, nasceu o Simultaneísmo.




Sonia se interessava também por como a luz transforma a nossa percepção das formas e cores. Observem o canto superior direito do quadro, notem os três círculos que representam globos de luz elétrica (que eram ainda uma novidade para a época), observem como as cores parecem irradiar a partir deles, notem como esses pontos de luz parecem influenciar o ambiente ao redor deles. Notem como Sonia fez um encadeamento de cores partindo desses pontos, sugerindo o efeito ótico de percepção através da luz.


Quando esse quadro foi exposto pela primeira vez em 1913, Sonia o intitulou de “Movimento, Cor e Profundidade, Dança no Bullier.” – a partir desse título fica fácil de compreender as intenções da artista de transcrever o movimento da dança através de cores e formas. Utilizando as cores de maneira inovadora Sonia Delaunay conseguiu criar uma obra que evoca a sensação de dança e de ritmo. As cores e formas não são usadas para criar a ilusão de realidade, mas sim para transcrever a sensação de estar em um salão de dança. Sonia foi uma artista que rompeu com a arte do passado e que compreendeu e abraçou a época na qual vivia. Ela desenvolve ao longo da carreira um universo particular de objetos e roupas que refletiam a sua pesquisa artística, ela afirmava que as cores “traziam alegria e verdade”. Para ela o progresso da sociedade estava intimamente ligado à Arte.

Agora me conte, ficou com vontade de dançar um Tango?

Sonia Delaunay
Baile Bullier
1913
Museu de Arte Moderna de Paris – Centro Pompidou
Óleo sobre tela - 0,97 x 3,90m


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